terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Não falta água, falta ação

Por Raimundo Marinho/Mandacaru da Serra

Uso da água do açude Luiz Vieira, do DNOCS, encontra-se praticamente "privatizado"

A discussão sobre a escassez de água para irrigação, no pólo de fruticultura formado pelos municípios de Livramento de Nossa Senhora e Dom Basílio, na Bahia, tornou-se repetitiva, inócua e politicamente incorreta. Sucessivas “audiências públicas” e viagens a Brasília, tudo inútil, pois falta o essencial: vontade e ação e sobejam as conversas para boi dormir, ordinariamente, em véspera de eleição, de dois em dois anos.

Uma vaca não pode dar mais leite do que permitem as condições naturais do seu ubre. Assim é o açude Luiz Vieira (Rio de Contas), o qual, feito para suprir 5.000 ha, em Livramento, não pode irrigar as mais de 12.000 mil ha que lhe são exigidas, nos dois municípios. Não haverá solução, se tudo não for recolocado no eixo inicial, o que inclui o uso da água em sua finalidade original e a conclusão do projeto do DNOCS, inacabado há mais de 20 anos.

O decantado pólo de fruticultura de Livramento e Dom Basílio, baseado na manga e maracujá, na verdade, possui bases falsas e ilegais. De um lado, parte da área plantada é formada de terras desapropriadas pela União e irregularmente ocupadas por grandes produtores. De outro, fora os 3.500 ha do chamado bloco III, que o DNOCS conseguiu viabilizar, o uso da água para irrigação dos outros 8.500 hectares tornou-se privado, portanto, irregular.

Plantou-se mais do que a capacidade hídrica disponível na região, não havendo perspectiva de solução definitiva à vista, em razão dos interesses políticos e econômicos envolvidos. Buscam-se paliativos na tentativa de se agregar à oferta de atual de água (105 milhões de m³) pelo menos mais 20 milhões de m³, que deverão custar cerca de R$20 milhões. Os fruticultores, que faturam por volta de R$1 bilhão por ano, não querem ter esta despesa e empurram o problema para o governo, que se tem feito de surdo.

Em torno dessa quizila é que giram os sucessivos e inócuos debates, nas repetidas e inúteis audiências públicas, não havendo nem mesmo projeto formal nesse sentido. O próprio prefeito de Livramento, Carlos Batista, que não conseguiu viabilizar uma solução quando tinha no colo o então ministro da Integração Nacional, entregou a questão para Deus, ao afirmar, na audiência pública de 9 de dezembro: “esperamos em Deus que tudo isso seja solucionado o mais breve possível”.

O contexto da frase, divulgado no site oficial, é mais amplo, onde ele, certamente amaldiçoando o outrora seu “deus Geddel Vieira Lima”, teria dito, em típico jogo para a platéia: “Temos buscado constantemente a realização destas obras que são fundamentais para a sobrevivência do pólo de fruticultura regional. Estamos contando com o apoio dos deputados aqui presentes, bem como seus representantes e esperamos em Deus que tudo isso seja solucionado o mais breve possível”.

Só havia dois parlamentares, um deles Edson Pimenta, único a comparecer na audiência anterior, em 29 de maio último, de uma lista de 61 convidados. Na ocasião, ele arrancou aplausos do auditório da Câmara, dizendo que eram projetos de fácil execução, que, além de vontade política, faltava vergonha dos políticos. Disse que bastariam recursos das emendas parlamentares para financiar as obras e, se cada um colaborasse, a transposição seria feita este ano. Chegou a disponibilizar R$1 milhão da sua cota de R$6 milhões anuais.

Porém, na segunda reunião, início deste mês, ele nem tocou no assunto, mudando o discurso para: “Se dependesse apenas de minha caneta, de uma rápida assinatura, podem ter certeza que já teríamos iniciado as obras. Posso afirmar que, Livramento, Dom Basílio e Rio de Contas contam com o meu apoio, desta forma, levarei as reivindicações de vocês ao Congresso e também lutarei por esta causa”.

Assim, não há solução a vista, apenas palcos eleitoreiros. Mas, por via das dúvidas, a Comissão Gestora dos Açudes arranjou um nome mais pomposo para o problema: “Programa Emergencial de Gestão Hídrica”. A idéia sustenta-se nos projetos cantados e decantados, mas sem qualquer formatação, de pressurização do Bloco I, no Perímetro Irrigado do Brumado; e de transposição de água dos rios Taquari, Vereda e Brumado para o açude público Riacho do Paulo.

Os produtores não querem gastar o dinheiro da produção, acima de R$1 bilhão por ano, e os governos, estadual e federal, nem ai para o problema, apesar do suposto peso das autoridades e importância das entidades que endossam as reivindicações: prefeitos Carlos Batista (Livramento), Marcio Farias (Rio de Contas), Luciano Pereira (Dom Basílio); Associação do Distrito de Irrigação do Brumado-ADIB; Comissão Gestora dos Açudes Públicos “Brumado” e “Riacho do Paulo”; Câmara de Diretores Lojistas; DNOCS; Câmara de Vereadores (Rio de Contas, Livramento e Dom Basílio); deputados federais Valdenor Pereira e Edson Pimenta; sindicatos e outros.

De três uma: ou as autoridades arroladas pouco valem; ou só Deus resolve; ou o governo é duro na queda. Ou, ainda, que o problemazinho pode ser resolvido pelos próprios produtores, com apenas 2% do que faturam em um ano. Se eles criaram o problema, plantando mais do que permitia a capacidade hídrica da região, que resolvam. E quem garante que, feitas as obras, não vão, insanamente, continuar ampliando a área plantada?

Mas não custa perguntar: quantas emendas a respeito já estão no orçamento da União, quantos projetos já foram entregues ao Ministério da Integração Nacional, pelos bonzinhos deputados que querem ajudar?


Nenhum comentário: